“Nenhum eufemismo por mais belo e reconfortante que seja é capaz de alterar concretamente a condição proletária do trabalho sob a égide da produção capitalista de mercadorias”. Karl Marx
Das entranhas do feudalismo e na transição para a modernidade, o capitalismo se consolidou como sistema produtor de mercadorias a partir da exploração do trabalho humano via extração da mais-valia. Mas o capitalismo não é só mercadoria tangível e o consumismo como paradigma; representa um novo padrão de sociabilidade expressa através de uma nova cultura e de todo um processo ideológico de subordinação do proletário às múltiplas determinações da reprodução do capital.
O sistema capitalista desde as suas origens se deparou com a ocorrência de crises de várias dimensões. Da “Grande Depressão” na década de 1870, do Crash da Bolsa de New York em 1929, as grandes guerras, passando pela crise do petróleo nos anos 1970 e chegando à atual crise que lançou, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cerca de 235 milhões de desempregados no mundo, em 2009, somando aos cerca de 730 milhões de seres humanos que vivem em condição de subemprego, com uma renda diária inferior a um dólar americano.
Da crise do Estado de Bem-Estar Social à superação do modelo fordista de acumulação dos anos 1970 para cá, o mundo capitalista se deparou com uma situação de crise estrutural. Com a crise, o capitalismo impôs um vigoroso processo de reestruturação produtiva, em termos dos países do capitalismo avançado a partir de inovações técnicas, organizacionais, financeiras e informacionais, no intuito de implantar um novo padrão de acumulação, o toyotismo, como estratégia para recuperar os níveis de produtividade, debelar tal crise e, por conseqüência, aumentar os índices de extração da mais-valia em escala global, bem como manter os pilares de vigência do sistema numa versão que foi e continua sendo denominada de neoliberal.
Tais inovações compõem o novo paradigma flexível. Esse padrão de acumulação caracteriza-se pelo conflito aberto com a rigidez do modo fordista de produção. A essência desse novo padrão está na flexibilidade dos processos e dos mercados de trabalho, bem como dos produtos e dos padrões de consumo. O trabalho é condenado ao total estranhamento levando os trabalhadores a oferecer a sua própria vida ativa às determinações e à incontrolabilidade do capital, isto não sem a irrupção de algum tipo de resistência. Para conformar essa nova realidade sócio-econômica, o neoliberalismo impôs ao longo destas duas últimas décadas um mix de desregulamentação do mercado de trabalho, desemprego estrutural, flexibilização, terceirização ou subcontratação, precarização, trabalho parcial, o banco de horas, a redução de salários e redução ou supressão de gastos e o desmonte dos direitos sociais previstos na Constituição de 1988.
Neste contexto, o capitalismo define as suas grandes classes sociais constitutivas e antagônicas, criando identidades a partir da posição de cada uma delas no processo de produção e extração da mais-valia. Para minar a resistência dos trabalhadores, o capital renova as formas de controle do processo de trabalho. Impõe a necessidade de que o proletário adote o ideário da empresa, devendo tê-la como o fim em si mesmo de sua própria existência social, numa demonstração cabal da influência dos métodos relacionados com o toyotismo, expressada na ideologia neoliberal, de apropriação do intelecto e manipulação da subjetividade da classe trabalhadora.
No decorrer de tais transformações na esfera da acumulação a classe trabalhadora é “rebatizada” em elemento de colaboração, a fim de identificar os interesses conflitantes e extinguir os antagonismos da relação capital-trabalho. Essa nova acumulação passou a ser chamada por alguns autores pós-modernos,
de “Semiocapitalismo”, ou seja, uma espécie de capitalismo semiótico (imaterial e cognitivo) que ocorre primordialmente no setor de serviços. O semiocapitalista, na realidade, é profundamente constituído por discursos verbais e não-verbais, cujo objetivo estratégico é utilizar o marketing no intuito de ampliar cada vez mais o processo da circulação e o consumismo, criando símbolos de um suposto mundo sem contradições. Instala-se uma “máquina de subjetivação capitalística” extremamente eficaz, na medida em articula forma e conteúdo, em discursos fáceis de ser assimilados, naturalizando e banalizando a ordem capitalista e seus valores essenciais, devidamente espalhados por toda a sociabilidade.
Nesse diapasão, o trabalho imaterial diz respeito ao trabalho intelectual ou lingüístico e a produção de idéias, símbolos, códigos, bem como produtos culturais, devidamente relacionados com o “trabalho afetivo”, que cria afetos, e sensações de bem-estar, comodidade, culminando na satisfação e excitação típicas do consumista pós-moderno. O trabalho imaterial leva à criação de uma espécie de adoração tangível pelos objetos do consumo, de uma “simpatia capitalizada, da amabilidade vulnerável, pelo Controle ‘criativo’ da dosagem de afetos e signos. Esses são os ‘novos recursos para o bom adestramento’” no dizer de Nery Atem.
Neste sentido, as atuais práticas do mundo empresarial, ao que parece, almejaram aquilo que a sociedade capitalista ainda não havia conseguido séculos após séculos: eliminaram as contradições entre os pólos do trabalho e do capital. Dal Rosso diz: “de contradição o trabalhador se transforma em elemento de colaboração”. Hoje, tanto em São Luís, no Brasil como em todo o mundo, parece ser prática comum das empresas rebatizarem seus “assalariados”, “operários” ou “empregados” de “colaboradores”, “parceiros” ou “associados”.
Devemos perguntar, então: quais são os desdobramentos desse “rebatizado” do proletariado? Podemos afirmar que os processos de alienação da classe operária foram diminuídos ou eliminados? Ou, de outra maneira, o simples rebatizado, por assim dizer, do “assalariado” ou “trabalhador” de “colaborador” ou “parceiro” provoca mesmo uma inversão concreta em sua consciência, na direção da superação das contradições capital-trabalho?
A respeito do processo de fragmentação e rebaixamento da identidade de classe do conjunto dos trabalhadores “podemos considerar que na medida em que a reengenharia empresarial exige que seus empregados acreditem plenamente que trabalham para seus clientes, e não para seus chefes, imaginar-se como trabalhador torna-se descontextualizado”; segundo assevera Rafael Seabra. Afinal, reconhecer-se na condição de proletário/operário acaba sendo um disparate e uma ofensa pessoal. Isto porque o “trabalhador”, tornado “parceiro”, “associado” ou “colaborador”, não mais trabalha, apenas sente-se obrigado – subjetivamente – em atender as demandas do seu cliente, principalmente aqueles que lhe são fiéis, que têm em suas mãos o cartão de fidelidade da empresa. Para Marx: “o trabalho não é, por isso, a satisfação de uma carência, mas somente um meio para satisfazer necessidades fora dele”.
Como desdobramento real desse perverso processo de alienação do trabalho, na medida em que se “inverte” a ideologia do direito de propriedade e se aprofunda a exploração do trabalho como uma dolorosa recordação histórica da vigência da mais-valia absoluta, desta feita combinada com a mais-valia relativa, as empresas impõem suas estratégias de lucro a partir da fixação de metas para os empregados, de remuneração flexível, prêmios e avaliação ininterruptas sobre o desempenho de cada um, sem dó nem piedade.
Conclui-se que as falsas promessas de uma objetiva e real “parceria” e “colaboração” não cabem no figurino e nas determinações da lógica da lei do valor e sua extração da mais-valia a partir do trabalho humano. Afinal, o trabalhador do setor de serviços ou de outros setores da economia, não são, via de regra, sócio nem proprietário das empresas onde trabalham e nem perderam a sua condição proletária do trabalho, haja vista que a personificação do trabalho como atitude individual não consiste de nenhuma maneira na identidade entre trabalho e capital.
Das entranhas do feudalismo e na transição para a modernidade, o capitalismo se consolidou como sistema produtor de mercadorias a partir da exploração do trabalho humano via extração da mais-valia. Mas o capitalismo não é só mercadoria tangível e o consumismo como paradigma; representa um novo padrão de sociabilidade expressa através de uma nova cultura e de todo um processo ideológico de subordinação do proletário às múltiplas determinações da reprodução do capital.
O sistema capitalista desde as suas origens se deparou com a ocorrência de crises de várias dimensões. Da “Grande Depressão” na década de 1870, do Crash da Bolsa de New York em 1929, as grandes guerras, passando pela crise do petróleo nos anos 1970 e chegando à atual crise que lançou, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) cerca de 235 milhões de desempregados no mundo, em 2009, somando aos cerca de 730 milhões de seres humanos que vivem em condição de subemprego, com uma renda diária inferior a um dólar americano.
Da crise do Estado de Bem-Estar Social à superação do modelo fordista de acumulação dos anos 1970 para cá, o mundo capitalista se deparou com uma situação de crise estrutural. Com a crise, o capitalismo impôs um vigoroso processo de reestruturação produtiva, em termos dos países do capitalismo avançado a partir de inovações técnicas, organizacionais, financeiras e informacionais, no intuito de implantar um novo padrão de acumulação, o toyotismo, como estratégia para recuperar os níveis de produtividade, debelar tal crise e, por conseqüência, aumentar os índices de extração da mais-valia em escala global, bem como manter os pilares de vigência do sistema numa versão que foi e continua sendo denominada de neoliberal.
Tais inovações compõem o novo paradigma flexível. Esse padrão de acumulação caracteriza-se pelo conflito aberto com a rigidez do modo fordista de produção. A essência desse novo padrão está na flexibilidade dos processos e dos mercados de trabalho, bem como dos produtos e dos padrões de consumo. O trabalho é condenado ao total estranhamento levando os trabalhadores a oferecer a sua própria vida ativa às determinações e à incontrolabilidade do capital, isto não sem a irrupção de algum tipo de resistência. Para conformar essa nova realidade sócio-econômica, o neoliberalismo impôs ao longo destas duas últimas décadas um mix de desregulamentação do mercado de trabalho, desemprego estrutural, flexibilização, terceirização ou subcontratação, precarização, trabalho parcial, o banco de horas, a redução de salários e redução ou supressão de gastos e o desmonte dos direitos sociais previstos na Constituição de 1988.
Neste contexto, o capitalismo define as suas grandes classes sociais constitutivas e antagônicas, criando identidades a partir da posição de cada uma delas no processo de produção e extração da mais-valia. Para minar a resistência dos trabalhadores, o capital renova as formas de controle do processo de trabalho. Impõe a necessidade de que o proletário adote o ideário da empresa, devendo tê-la como o fim em si mesmo de sua própria existência social, numa demonstração cabal da influência dos métodos relacionados com o toyotismo, expressada na ideologia neoliberal, de apropriação do intelecto e manipulação da subjetividade da classe trabalhadora.
No decorrer de tais transformações na esfera da acumulação a classe trabalhadora é “rebatizada” em elemento de colaboração, a fim de identificar os interesses conflitantes e extinguir os antagonismos da relação capital-trabalho. Essa nova acumulação passou a ser chamada por alguns autores pós-modernos,
de “Semiocapitalismo”, ou seja, uma espécie de capitalismo semiótico (imaterial e cognitivo) que ocorre primordialmente no setor de serviços. O semiocapitalista, na realidade, é profundamente constituído por discursos verbais e não-verbais, cujo objetivo estratégico é utilizar o marketing no intuito de ampliar cada vez mais o processo da circulação e o consumismo, criando símbolos de um suposto mundo sem contradições. Instala-se uma “máquina de subjetivação capitalística” extremamente eficaz, na medida em articula forma e conteúdo, em discursos fáceis de ser assimilados, naturalizando e banalizando a ordem capitalista e seus valores essenciais, devidamente espalhados por toda a sociabilidade.
Nesse diapasão, o trabalho imaterial diz respeito ao trabalho intelectual ou lingüístico e a produção de idéias, símbolos, códigos, bem como produtos culturais, devidamente relacionados com o “trabalho afetivo”, que cria afetos, e sensações de bem-estar, comodidade, culminando na satisfação e excitação típicas do consumista pós-moderno. O trabalho imaterial leva à criação de uma espécie de adoração tangível pelos objetos do consumo, de uma “simpatia capitalizada, da amabilidade vulnerável, pelo Controle ‘criativo’ da dosagem de afetos e signos. Esses são os ‘novos recursos para o bom adestramento’” no dizer de Nery Atem.
Neste sentido, as atuais práticas do mundo empresarial, ao que parece, almejaram aquilo que a sociedade capitalista ainda não havia conseguido séculos após séculos: eliminaram as contradições entre os pólos do trabalho e do capital. Dal Rosso diz: “de contradição o trabalhador se transforma em elemento de colaboração”. Hoje, tanto em São Luís, no Brasil como em todo o mundo, parece ser prática comum das empresas rebatizarem seus “assalariados”, “operários” ou “empregados” de “colaboradores”, “parceiros” ou “associados”.
Devemos perguntar, então: quais são os desdobramentos desse “rebatizado” do proletariado? Podemos afirmar que os processos de alienação da classe operária foram diminuídos ou eliminados? Ou, de outra maneira, o simples rebatizado, por assim dizer, do “assalariado” ou “trabalhador” de “colaborador” ou “parceiro” provoca mesmo uma inversão concreta em sua consciência, na direção da superação das contradições capital-trabalho?
A respeito do processo de fragmentação e rebaixamento da identidade de classe do conjunto dos trabalhadores “podemos considerar que na medida em que a reengenharia empresarial exige que seus empregados acreditem plenamente que trabalham para seus clientes, e não para seus chefes, imaginar-se como trabalhador torna-se descontextualizado”; segundo assevera Rafael Seabra. Afinal, reconhecer-se na condição de proletário/operário acaba sendo um disparate e uma ofensa pessoal. Isto porque o “trabalhador”, tornado “parceiro”, “associado” ou “colaborador”, não mais trabalha, apenas sente-se obrigado – subjetivamente – em atender as demandas do seu cliente, principalmente aqueles que lhe são fiéis, que têm em suas mãos o cartão de fidelidade da empresa. Para Marx: “o trabalho não é, por isso, a satisfação de uma carência, mas somente um meio para satisfazer necessidades fora dele”.
Como desdobramento real desse perverso processo de alienação do trabalho, na medida em que se “inverte” a ideologia do direito de propriedade e se aprofunda a exploração do trabalho como uma dolorosa recordação histórica da vigência da mais-valia absoluta, desta feita combinada com a mais-valia relativa, as empresas impõem suas estratégias de lucro a partir da fixação de metas para os empregados, de remuneração flexível, prêmios e avaliação ininterruptas sobre o desempenho de cada um, sem dó nem piedade.
Conclui-se que as falsas promessas de uma objetiva e real “parceria” e “colaboração” não cabem no figurino e nas determinações da lógica da lei do valor e sua extração da mais-valia a partir do trabalho humano. Afinal, o trabalhador do setor de serviços ou de outros setores da economia, não são, via de regra, sócio nem proprietário das empresas onde trabalham e nem perderam a sua condição proletária do trabalho, haja vista que a personificação do trabalho como atitude individual não consiste de nenhuma maneira na identidade entre trabalho e capital.
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